sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

O Natal que não se embrulha

O Natal que não se embrulha - JPM 

 Num vilarejo lá para os alentejos, havia um relojoeiro que parecia fazer magia com a sua arte e, sobretudo, com a capacidade de cativar as pessoas com as suas histórias. 

O seu nome era Manuel. As suas histórias agradavam tanto a graúdos como a pequenos, a clientes e a amigos. O tempo parecia não passar naquela relojoaria — talvez coisas de povoados pequenos.

Lá pela quadra de Natal, apareceu uma moça com cara de menina. Chamava-se Pepita. Era estranha no vilarejo. Levava consigo um relógio de bolso. Este parecia antigo, com sinais evidentes de uso: estava riscado e com os ponteiros parados.

Pepita, com alguma ansiedade, explicou ao Sr. Manuel que o relógio era do seu pai, falecido precocemente. Queria arranjá-lo para o oferecer ao seu filho, ainda bebé. Queria dar vida ao relógio, mas também dar vida assim aos seus que já não podiam estar com ela naquele Natal.

O Sr. Manuel ouviu a história de Pepita (quase diria cativado por ela, mas ele cativava-se pelas pessoas) e pôs-se a arranjar o relógio. Durante o tempo em que consertava, o Sr. Manuel contava as suas histórias.

Enquanto o ouvia, emocionada pelas histórias, reluziam os seus olhos grandes, bonitos, castanhos e ansiosos. Pepita parecia estar a viver uma mistura de bons sentimentos. As memórias do seu pai misturavam-se com a habilidade do Sr Manuel contar histórias

Lá ia dizendo o Sr. Manuel:

“Sabe, menina, o Natal não é só feito do que compramos para oferecer nestes dias, do que pode ser embrulhado. O Natal é muito mais do que isso. O Natal é, sobretudo, o tempo que dedicamos aos outros. Não temos de ser caridosos apenas no Natal.”

Pepita continuava a ouvir atentamente o Sr. Manuel. Quando este finalmente terminou, entregou-lhe de volta o relógio. Parecia que nunca tinha deixado de funcionar, estava apenas esquecido de trabalhar.

Quando Pepita ia a sair, o Sr. Manuel disse:

“Sabe, menina, o Natal não está neste simples relógio. Talvez ele a lembre do que o Natal realmente significa.”

Pepita, após ter o relógio arranjado, passou a pôr em prática o que sempre tinha pensado: espalhar o espírito natalício durante o ano todo.

Desde esse dia, Pepita passou a visitar o Sr. Manuel todos os anos. Sempre que podia, passava pela sua relojoaria e ficava à conversa com ele.

Pepita percebeu que o tempo é o maior presente que alguém pode usufruir e oferecer. Com o espírito certo, qualquer dia pode ser Natal.

Aos meus pais, Pepita e Manuel.


Fotografia do meu amigo Miguel Valle de Figueiredo.

A fotografia foi feita no Hospital Miguel Bombarda a partir de um cartaz de (Bailarino) Valentim de Barros, uma história de vida que não é exactamente um conto de Natal, mas que serve para nos lembrar da humanidade que tantas vezes anda desaparecida.

Um pouco mais sobre Valentim aqui

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